Experiências

América do Sul com R$ 100 por Dia: Viagem Possível?

Tudo começou com uma inquietação. Eu queria muito conhecer a América do Sul, mas o orçamento era limitado — muito limitado. Em vez de ver isso como um obstáculo, encarei como um desafio. Foi aí que surgiu a pergunta: seria possível viajar pela América do Sul com apenas R$ 100 por dia? A ideia parecia ousada, até um pouco louca. Mas a vontade de viver essa experiência era maior do que qualquer medo ou dúvida.

Durante meses, li relatos, pesquisei rotas e acompanhei mochileiros que já tinham feito algo semelhante. Vi que, sim, era possível. Mas exigiria adaptação, desapego e uma boa dose de coragem. Não era apenas sobre economia, era sobre mudar a forma de ver e viver o mundo.

Fazer essa viagem era também uma maneira de realizar um sonho antigo: cruzar fronteiras por terra, ver paisagens mudando gradualmente, ouvir diferentes sotaques e línguas, experimentar sabores novos em cada parada. Era um chamado para uma jornada mais profunda, tanto exterior quanto interior.

Por Que Escolhi Esse Estilo de Viagem

Antes mesmo de decidir para onde iria, me perguntei: por que quero viajar com tão pouco dinheiro? A resposta veio fácil: eu queria viver de verdade. Não queria ser só mais uma turista tirando fotos dos pontos turísticos. Queria me conectar com as pessoas, entender a cultura, experimentar o cotidiano local. E isso, eu acreditava, só seria possível se eu viajasse de forma simples e consciente.

Viajar com um orçamento apertado me forçou a sair da zona de conforto. Foi minha forma de provar, inclusive para mim mesma, que não é preciso ser rica para viver algo grandioso. Que a viagem não depende do saldo bancário, mas da disposição de se abrir ao novo, ao simples, ao inesperado.

Também havia uma motivação social por trás da decisão. Sempre me incomodou a ideia de que viajar é um privilégio exclusivo de quem tem muito dinheiro. Eu queria quebrar esse mito, mostrar que com planejamento e propósito, é possível viver experiências intensas mesmo com poucos recursos. Queria que outras pessoas se inspirassem e acreditassem que também poderiam trilhar caminhos parecidos.

Esse estilo de viagem, mais econômico e próximo da realidade local, também despertou em mim um olhar mais sensível para as desigualdades sociais, a sustentabilidade e a forma como o turismo pode impactar (positiva ou negativamente) os lugares que visitamos. Foi um aprendizado contínuo sobre respeito, empatia e responsabilidade.

Planejamento Pré-Viagem: Entre Planilhas e Sonhos

Apesar de toda a empolgação, eu sabia que uma viagem dessas exigiria planejamento. Pesquisei bastante para escolher os países com custo de vida mais baixo e deslocamento acessível. Defini uma rota inicial passando por Bolívia, Peru, Equador, Colômbia e, em trechos específicos, Argentina e Chile.

Pesquisei clima, cultura, segurança, câmbio e transporte em cada região. Tentei entender quais eram os períodos mais baratos para viajar, quais fronteiras poderiam ser cruzadas por terra e onde seria mais fácil encontrar voluntariados ou hospedagem acessível. Essa fase foi tão empolgante quanto a própria viagem. Cada informação encontrada me dava a sensação de estar mais próxima do sonho.

Criei uma planilha com uma estimativa de gastos por categoria: transporte, alimentação, hospedagem e extras. Estabeleci o limite diário de R$ 100, sabendo que em alguns dias gastaria menos e, em outros, um pouco mais. Também reservei um fundo de emergência — item essencial para qualquer mochileiro econômico.

Na mochila, levei apenas o necessário: roupas leves, um bom par de tênis, itens de higiene, uma garrafa reutilizável, documentos e um caderno de anotações. Nada além disso. Cada item precisava ser funcional. Além disso, baixei aplicativos úteis para mapas offline, controle de gastos e plataformas de hospedagem alternativa. A internet foi uma grande aliada tanto no planejamento quanto na execução.

Levei também uma pastinha com cópias de documentos importantes, cópias digitais salvas na nuvem e uma lista de contatos de emergência. Aprendi que se preparar para os imprevistos é uma forma de cuidar de si e da viagem.

Outra parte importante do planejamento foi conversar com quem já tinha feito algo parecido. Entrei em grupos de mochileiros nas redes sociais, li blogs independentes, troquei mensagens com desconhecidos que, generosamente, me deram conselhos valiosos. Essa troca de informações foi essencial para me sentir mais segura.

R$ 100 por Dia: Como Isso Funciona na Prática?

Na teoria, parecia possível. Mas na prática, era preciso atenção em cada escolha. Eu dividia o orçamento mais ou menos assim: cerca de R$ 30 a R$ 40 com hospedagem (hostels, casas de locais ou voluntariado), R$ 30 com alimentação (feiras, comida de rua e mercados locais), e o restante com transporte e pequenos extras.

O segredo era ser flexível. Em muitos dias, eu gastava bem menos, principalmente quando conseguia hospedagem gratuita em troca de trabalho ou quando fazia refeições mais simples. O café da manhã incluso no hostel era uma bênção. Andar a pé sempre que possível também ajudava a economizar.

Outra prática que me ajudou muito foi cozinhar. Muitos hostels oferecem cozinha comunitária, e cozinhar com outros viajantes virava um momento de troca cultural. Às vezes dividíamos compras e preparávamos refeições juntos, o que além de econômico, rendia amizades e boas histórias.

Descobri que negociar é uma arte — e que os locais muitas vezes oferecem dicas que não estão em nenhum guia de viagem. Além disso, evitei atrações pagas muito turísticas e me concentrei em trilhas, mirantes e eventos culturais gratuitos. A experiência era muito mais rica do que eu poderia imaginar.

Houve dias em que consegui gastar apenas R$ 50. Outros, como em deslocamentos longos ou cidades mais caras, extrapolei um pouco. Mas o equilíbrio se manteve, e em nenhum momento o orçamento diário foi um peso. Ele era um guia, não uma prisão.

Também aprendi a priorizar experiências que me acrescentassem algo. Se fosse para gastar, que fosse em algo significativo, como uma aula de culinária local, uma visita guiada por uma comunidade indígena ou um passeio feito por um guia morador da região.

Desafios (e Surpresas) pelo Caminho

Claro que nem tudo foram flores. Teve dia em que a comida foi escassa, em que o cansaço bateu forte ou que a solidão deu as caras. Mas cada dificuldade veio acompanhada de algum aprendizado. Aprendi a confiar mais em mim, a pedir ajuda quando precisava e a rir das situações mais inusitadas.

Enfrentei mudanças de clima, ônibus lotados, atrasos, e até passei mal por causa da altitude na Bolívia. Mas sempre havia alguém disposto a ajudar — outro viajante, um morador local, um funcionário de terminal de ônibus. A solidariedade no caminho foi uma das maiores surpresas.

Em contrapartida, também tive surpresas maravilhosas: um convite inesperado para almoçar com uma família local, um passeio gratuito com outros viajantes, um voluntariado que virou amizade. Momentos que nenhum roteiro pago poderia prever.

Esses encontros foram o verdadeiro ouro da viagem. Gente comum com histórias incríveis, que me acolheram, ensinaram, riram e choraram comigo. A hospitalidade sul-americana é algo que levarei para sempre no coração.

Esses momentos me fizeram perceber que os melhores dias da viagem eram, quase sempre, aqueles não planejados. Aqueles em que eu me permitia estar aberta, disponível, presente. O improviso virou rotina — e isso me libertou.

Voluntariado e Trocando Trabalho por Hospedagem

Uma das estratégias que mais funcionou para mim foi o voluntariado. Usei plataformas como Worldpackers e Workaway para encontrar oportunidades em hostels, cafés e até projetos sociais. Em troca de algumas horas de trabalho, eu ganhava hospedagem e, às vezes, refeições.

Essa troca me ajudou não só a economizar, mas também a me integrar mais à rotina local. Era uma forma de fazer parte da comunidade, de construir conexões reais e viver o destino de forma intensa. Sem contar que o custo diário caía bastante — às vezes, eu passava dias sem gastar praticamente nada.

Em uma cidadezinha no interior do Peru, por exemplo, trabalhei numa pousada ajudando na recepção e fazendo traduções para os hóspedes. Em outro momento, ensinei inglês para crianças em um projeto social na Colômbia. Essas experiências me deram muito mais do que hospedagem: me deram propósito.

Além disso, o voluntariado me ensinou a ser mais resiliente, a lidar com diferentes culturas e a desenvolver habilidades novas. Foi uma escola prática, que nenhuma sala de aula poderia oferecer.

Também tive a chance de participar de atividades sustentáveis, como hortas comunitárias, reciclagem criativa e oficinas de artesanato. Ver de perto como essas iniciativas transformam realidades foi inspirador e me fez refletir sobre meu papel como viajante no mundo.

É Realmente Possível Viajar Assim?

Sim, é possível. Mas exige preparo, mente aberta e bastante jogo de cintura. Viajar com R$ 100 por dia não é confortável, mas é transformador. Você aprende a se virar, a enxergar valor no essencial e a dar importância às experiências, e não às posses.

Não estou dizendo que é fácil — não é. Mas para quem está disposto a se adaptar e buscar soluções criativas, a recompensa é imensa. Eu vivi momentos únicos, aprendi com cada perrengue e saí muito mais rica em histórias do que quando entrei nessa jornada.

Essa forma de viajar também me mostrou o valor do tempo. Sem correria, sem itinerários engessados, pude viver cada lugar com mais profundidade. Ficar mais tempo em um mesmo destino, explorar seus arredores, conhecer o ritmo local — isso não tem preço.

Além disso, percebi que o que realmente importa numa viagem não é o que se consome, mas o que se vive. Não é sobre fazer check-in em pontos turísticos famosos, mas sobre se permitir estar presente em cada momento.

Essa jornada me provou que há muitas formas de viver uma aventura — e que viajar devagar, com o coração aberto, é uma das mais ricas que existem.

O Que Essa Jornada Me Ensinou

Voltei com a mochila mais leve, mas com o coração cheio. Descobri que a verdadeira riqueza de uma viagem está nas trocas humanas, nas paisagens que você conquista com esforço e nos sorrisos que surgem sem aviso.

Viajar pela América do Sul com R$ 100 por dia não foi apenas uma aventura — foi uma lição de vida. Uma prova de que os limites financeiros não precisam ser barreiras intransponíveis, e que a estrada está cheia de possibilidades para quem tem coragem de se lançar.

Essa jornada me ensinou que o mundo é muito maior do que eu imaginava — e ao mesmo tempo, mais próximo do que parece. Que a solidariedade existe, que o improviso é uma arte, e que viver com pouco pode ser libertador.

Aprendi que cada país tem suas próprias dores e belezas, que as culturas sul-americanas são riquíssimas e diversas, e que há muito o que descobrir além do óbvio. Entendi que viajar pode ser um ato político, de resistência, de transformação.

Se eu faria tudo de novo? Sem dúvida. E recomendo para quem quer mais do que fotos bonitas: quer histórias reais para contar. Porque no fim das contas, viajar com pouco não é sobre ter menos — é sobre viver mais.

Carol Medeiros

Sou redatora especializada em viagens econômicas, com formação em Marketing. Meu objetivo é ajudar viajantes a explorar destinos incríveis sem ultrapassar o orçamento, oferecendo dicas práticas e inteligentes. Acredito que viajar bem não precisa ser caro, só inteligente. Aqui no blog compartilho minhas experiências e estratégias para planejar viagens acessíveis e inesquecíveis, ajudando você a aproveitar ao máximo cada destino sem comprometer suas finanças.

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